domingo, 16 de dezembro de 2007

Um Caminho para Niterói

Um Caminho para Niterói a propósito dos 100 anos de Niemeyer

Daqui a 100 anos lembraremos que Niterói construiu o Caminho Niemeyer. Daqui a 100 anos, lembraremos tudo que um dos últimos mestres da Arquitetura Moderna realizou e ainda realiza. Daqui a 100 anos, o aquecimento global terá alcançado níveis que farão os mares subirem? Daqui a 100 anos precisaremos de arqueólogos especializados nas cidades pós-modernas? É difícil pensar nos possíveis caminhos para Niterói. Mas não é pelo menos sensato escolhermos nosso caminho?

Arqueologuemos, então. Niterói significa, em tupi, águas escondidas. É... os nomes às vezes podem nos conduzir para caminhos nunca navegados e, como diria o poeta, “navegar é preciso”. De certa forma, vamos navegar de qualquer jeito. Ironias à parte, o que nos falta é nosso significado, não nosso significante.

Daqui a alguns anos como estaremos? É... não dá pra afirmar, vamos só especular. Na avenida Roberto Silveira não passarão mais carros. A estrada Francisco da Cruz Nunes ficará engarrafada do Largo da Batalha até o ponto final do 46, em Várzea das Moças, por causa do trânsito de Maricá. Itacoatiara estará cercada de condomínios e seu acesso, limitado pela guarda municipal. Ah... Pendotiba não respirará mais o ar fresco da manhã, nem terá mais uma temperatura amena. A propósito, teremos o IPSA (Imposto Provisório Sobre o Ar). Não faremos mais distinção entre Fonseca, Barreto e São Gonçalo. Cubango, que significa barreira, não terá mais função. Qualquer chuva, em qualquer lugar, significará inundação. Nossas favelas não se resumirão ao nosso município, serão internacionais. Exportaremos pobres em embarcações especializadas parecidas com contêineres.

Pois é! Em 434 anos evoluímos para essa possibilidade de futuro. Nós somos isso! É nossa responsabilidade e, sendo assim, não importa que Araribóia tenha traído os índios em favor dos portugueses. O que importa é que esse é o mito fundador das águas escondidas e, mais, que “arari” significa tempestade.

Foi ouvindo a letra de um funk: “Ih, choveu! Cabelo encolheu todinho...”, que percebi que esse “I”, além de significar “água”, possui entonação que lhe atribui uma expectativa pela água que vai cair do céu. Logo, me parece correto não perder a “chapinha” e se esconder. Meu chapa, é disso que estamos falando: previsão, prevenção, planejamento... De uma forma ou de outra, a chuva virá e as conchas das colinas - os sambaquis - devem ser protegidos. Não estaremos protegendo só os índios, mas a nós mesmos, como a menina do funk que quer ter o direito de se achar mais bonita e como as nossas favelas, que não querem ser senzalas, querem ser quilombos.

Por que insistir nos mesmos erros? Por que reinventamos a roda? Pois mudanças no trânsito sobre as mesmas bases não são mudanças. Ao mesmo tempo que proíbem o transporte alternativo por interesses das empresas de ônibus, não esquecem o preço da passagem. Por que o MAC espelha a imagem que queremos, como a chapinha da menina? Por que temos que impedir os trabalhadores ambulantes de vender na água sagrada, Icaraí? Por que nosso centro histórico está cada vez mais esquecido? Por que nossos cinemas fecham? Por que nossos resíduos vão para um lixão já datado e nossa conta de água e nosso IPTU só aumentam sem a menor justificativa?

Em que medida permitimos que essas coisas aconteçam? “Tupi or not tupi”, eis a questão: o que nos unifica nessa grande pedra rachada, Itapuca? O que nos faz água-escondidos? Contra o que estamos lidando?

Pois bem: contra quem explora o trabalho; contra quem polui os rios e mares; contra quem proíbe o trabalho; contra a inércia do hábito e dos costumes; contra quem sobretaxa os trabalhadores; contra os que impedem o direito de ir e vir; contra a especulação imobiliária e as autoridades que a protegem; contra os tabus e a superstição... Por fim, esse é um bom passo, para começarmos a percorrer nosso caminho: a reconstrução do público, do saber popular, do direito à moradia, ao trabalho e à educação. Portanto, o direito à cidade. Pois passos isolados não formam caminhos e, como há uma “pedra no caminho”, Niterói precisa trilhar o seu para que no futuro possa comemorar não só as obras de Niemeyer, mas seus sonhos.
Publicado no Jornal Esquerda n. 4, Dezembro de 2007

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Resenha do livro "Urbanismo Rural"

José Geraldo da Cunha Camargo,1972.

O autor caracteriza o problema do êxodo rural como um dois problemas do fim do século e que deve ser enfrentado. Para isso identifica três tipos de adensamento populacional: 1) Áreas urbanas super-povoadas; 2) Zonas rurais densamente povoadas; 3) Zonas rurais pouco povoadas. Discorre, também, sobre o Planejamento para essas três densidades. Ou seja, para o regulamento das grandes cidades, para o crescimento ordenado e sua legislação e o planejamento urbano-rural e sua legislação.

O trabalho se debruça sobre o Urbanismo Rural. Seu planejamento físico e espacial, e sócio cultural. Construindo uma hierarquização dos núcleos urbanos no meio rural. “Para que o homem do campo não fuja para a cidade, devemos “trazer” a “cidade” para o campo, criando núcleos urbanos rurais”.

Para isso traça um roteiro de como implementar esses núcleos. A forma com que o autor trata da hierarquização se expressa a partir da relação entre as Agrovilas, Agrópolis e Rurópolis, criando uma rede entre elas e as cidades mais próximas. O livro é uma cartilha de implementação dessa proposta.

Resenha do livro "Planejamento Físico e Organização Espacial na Colonização de Terras"

Jacob O. Maos, 1978.
Jacob Maos disserta sobre a colonização de terras, onde “a reparação arbitrária do racional relativo à organização espacial da colonização de terras e seu subseqüente componente econômico têm a atenção dos planejadores do potencial inerte aos padrões espaciais e sociais da colonização rural” e sua “meta geral é a de valorizar a situação nas regiões deprimidas; desvendar as pressões migratórias sobre os centros urbanos e acelerar a transição da agricultura tradicional para a agricultura moderna”. Estabelece um esboço conceitual que pressupõe: atividade agricultura ou sócio-econômica; incorporar meios funcionais; problematizar as adaptações culturais e sociais; não se prender as complexidades da colonização tradicional; a produtividades nas áreas adicionais; mais áreas para cultivo; direcionar o ciclo migratório para áreas que não os centros urbanos super-povoados; novos recursos e forma de crescimento no meio rural.
Enfim, trata das escalas, a moradia, a vila e o grupo inter-vila. Apropriadas pelos camponeses num nível de cooperação, podendo gerar crescimento econômico. Para isso seus objetivos são: 1) maximizar o número de famílias; 2) maximizar o emprego; 3) recreação e serviços; 4) ambiente social propício. A fazenda familiar, a comunidade e a região de colônias rurais, serão mecanismos de fortalecer os sujeitos em processos de: a) subsistência; b) subsistência e produção; c) especialização. De forma a valorizar os aspectos físicos, humanos e institucionais.
O autor, ao falar das experiências recentes, afirma que a colonização Européia é o modelo mundial rural. Logo, “o funcionamento e a evolução dos vários padrões de colonização podem ser melhor compreendidos pelo exame das mudanças espaciais ocorridas no passado”.
O caso de Israel – desenvolvimento rural integrado – é a síntese da experiência européia, dentro de um contexto geográfico, que gerou novos padrões de colonização: a) O mais antigo modelo de colonização densa e planejada (transplantada da Europa), onde a terra é distribuída aos colonos com os títulos de posse (fazendas grandes); b) Cooperativa de pequenos proprietários cada fazendeiro trabalha em sua própria parcela de terra e vive em sua sede; c) Sociedade coletiva e ideológica, onde a propriedade é dos próprios operários, que residem no seu centro, onde o lote é agregado a casa.
Na Itália, segundo o autor, o modelo de colonização é disperso, onde as desapropriações de latifúndios e loteamentos geraram o isolamento social das famílias agrícolas. Na Espanha “a ineficiência do minifúndio nortista e o desemprego crônico nas regiões de latifúndio têm causado baixos padrões de vida e pobreza, proporcionando o êxodo do setor mais jovem e mais dinâmico da população rural”. Mesmo assim existe um sistema de cooperação.
Por fim, é bom frisar, que no modelo de Israel a vila é parte de um grande sistema que permite expansão das atividades econômicas para além dos limites da própria vila, criando um modelo dinâmico, flexível, num estágio crescente de crescimento.
Na América Latina as características que são apontadas como: a ausência de avaliação da colonização de terras, problemas estruturais de serviços, padrões dispersos de concentração, o paternalismo dos esquemas de colonização, latifúndio, tendências os padrões agrícolas coletivos. Para organização espacial dos serviços rurais, Jacob, fala da necessidade de hierarquias, que estabeleçam áreas comunitárias, produtivas, Edu-cacionais e comercias, criando justaposições de sistemas rural e urbano.
Por fim, apresenta um modelo de colonização, estabelecendo critérios: minimi-zando distancias para o trabalho, custos de infra-estruturas, culturas, iniciativa individual e da família, pátio agrícola e flexibilidade de mudanças futuras na terra.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Resenha do Livro "América Latina fim do Milênio"

Roberto Segre, 1991

“América Latina fim do Milênio” trata do “desenvolvimento econômico, social e cultural da América Latina e a construção do espaço urbano e rural. Ou seja, a integração das obras “artísticas” ao processo complexo de produção geral do ambiente artificial e o relacionamento das distintas escalas do desenho, desde o território até o objeto artesanal ou industrial, numa tentativa de atingir uma visão globalizante identificada com o conceito de desenho urbano.” E mais “o debate sobre os significados de modernidade, identidade, tradição, cosmopolitismo e vernáculo não passa primordialmente pelos termos da expressão arquitetônica, pelo contexto social e econômico, ou seja pelas profundas contradições de classe ou pelo entrave ao desenvolvimento que a divida externa e a dependência para com os países industrialmente desenvolvidos constituem”. Então, o último “aspecto entre o projeto profissional e assimilação popular dos modelos da “alta” cultura, assim como a importância social das obras realizadas. Os habitantes das cidades latino-americanas não necessitam apenas de símbolos monumentais, mas, essen-cialmente de habitações, serviços e infra-estrutura técnicas que permitam melhorar a qualidade de vida das diferentes camadas sociais”.
Roberto Segre desenvolve um breve histórico da América Latina, passando pelos antecedentes históricos: 1) a complexidades do universo sócio-econômico; 2) a herança do período colonial; 3) esquema urbano (a trama); 4) o traçado viário; 5) os espaços públicos, semi-públicos e privados; 6) o sistema simbólico. Desta forma, estabelece não uma apologia simbólica, mas uma ambientação que não pode apagar mais de 400 anos de história.
A partir daí caracteriza o “entorno produtivo da dependência” analisando, as premissas conceituais, o entorno urbano e rural na produção da colônia, a renovação tecnológica das estruturas industriais (que levou ao desenvolvimento dos primórdios do hábitat proletário). Em resumo, o processo de industrialização da América Latina cria uma ruptura radical entre o hábitat rural e o urbano [proletários e camponeses]. O resultado desse processo são as construções dos primeiros conjuntos habitacionais.
No capitulo 5, Segre, desenvolve o tema da “tradição e renovação na arquitetura neocolonial”, analisando seus fundamentos teórico; a relação da arquitetura com a ideologia (Pág. 125); as contradições entre forma e conteúdo. Na analise dos componentes cultos e populares na arquitetura vernácula, Segre, cita Wright como exemplo de residências neocoloniais. No Caribe (Republica Dominicana e San Juan) a influência será percebida nas residências da classe média.
“A síntese entre a corrente neocolonial, as tradições vernáculas locais ou assimiladas através da experiência norte-americana e as inovações formais e espaciais do movimento moderno constitui uma das alternativas fundamentais da arquitetura moderna na América Latina, que conseguiu dar formas a elementos da sua própria identidade cultural ambiental”. [Lucio Costa, Rino Levi, Zanine, Severiano Mário Porto, são exemplo deste momento].
Depois da 2ª. Guerra, passaremos pela etapa dos grandes planos, como plano diretor de Buenos Aires, Havana, Cidade dos Motores-Brasil, Plano Diretor de Bogotá, projetos que seguiam as orientações do CIAM e da Carta de Atenas. Até chegar a “Brasília e a transformação do mito urbano” que conclui dizendo “hoje é indispensável estudar esse fenômeno e encontrar o ponto de articulação entre ação profissional e a ação espontânea da população, porque é impossível projetar uma cidade a partir de uma definição precisa de todos os seus componentes arquitetônicos, sem graus de liberdade para os usuários. Este é o problema que se deve enfrentar, em nossa realidade latino-americana, para encarar o desafio do século XXI: o vinculo entre projetistas e usuários, entre o “saber” profissional e o “saber” popular”.
Por fim, no capitulo 8, Segre define célula [residência] “como a dimensão individual da escala urbana”, analisando os valores simbólicos e funcionais, o conteúdo estético da habitação, a dimensão continental da pobreza, a integração da célula ao contexto urbano, portanto, “a célula original da cabana vitruviana integrou-se à cidade, é parte dela, e ao mesmo tempo, participante da riqueza expressiva de nossa cultura contemporânea. Já não é manifestação egocêntrica de um grupo social, a introversão segregativa do núcleo familiar na lonjura do subúrbio. A célula converte-se num fragmento multiplicado da estrutura urbana, no componente integrador da função habitar.” Completando, a isso, o capitulo 9, que diz respeito as estruturas do hábitat social. Portanto, a habitação como configuradora da trama urbana, até a construção da cidade alternativa. Em que “Essa atitude demonstra a imperiosa necessidade de chegar ao ponto de encontro entre o novo e o velho, entre tradição e inovação, a fim de conter a dinâmica dialética da vida cotidiana”, ao mesmo tempo em que esse movimento se dá é necessário recuperar os centros históricos das cidades.

domingo, 7 de outubro de 2007

Resenha do Livro "Evolução Urbana do Brasil"

Nestor Goulart Reis Filho, 1968
O livro trata da “evolução urbana no Brasil”, fazendo uma tentativa de mostrar que ela seguiu um plano de ocupação e que não é aleatória. Para isso, leva em conta vários exemplos históricos que comprovam essa análise, como o condicionamento do traçado, a existência de um plano de ocupação, e a relação ocupação e o plano, ou seja, se a comunidade aceitava ou não o plano e como se relacionava com ele.
Utiliza, também, dentro da metodologia, o conceito de “função urbana como função social. Por unidade do sistema social – ação, relação, posição, personalidade, emprego, instituição, camada, etc. – fenômenos sociais e desempenhar dentro deles ordem metodológica”. [Florestan Fernandes]. Analisa as funções urbanas como componentes do sistema global, conexão típica da função urbana. Contando que os centros urbanos são apenas componentes nucleares que, por isso, sua função está associada a esse contexto e a forma com que o individuo materializa essas funções [urbanismo moderno].
O autor ao caracteriza o Brasil colônia. Sua economia de exportação e toda a sua organização social, quer dizer: Latifúndio, mão-de-obra escrava, sociedade patriarcal, etc. Seu intuito é mostrar que o desenho urbano também está condicionado à colonização. Para corroborar com isso, apresenta diversas imagens dos principais centros do período (Salvador, Olinda e Rio de Janeiro) e as datas de fundação das vilas e cidades do Brasil. Essa analise vai até a descoberta do ouro pelos bandeirantes, e futuramente Minas Gerais, chegando até 1720, no primeiro conflito urbano.
Posteriormente, o autor discorre sobre como os núcleos urbanos se desenvolveram, uns pela dispersão, outros pela centralização e que esse sistema estava ligado ao sistema colonial internacional. E, que isso, gerou uma organização espacial específica, onde se aplicou a regularidade do traçado, ruas e praças que ligavam os domicílios aos edifícios públicos, preocupação com a aparência das praças e ruas (século XVII, por causa da maior utilização das ruas), quadras e lotes, bairros e zoneamento, construções e até a necessidade de monumentalidade, conseqüente, dos edifícios militares e religiosos, que desenharam o Brasil colonial.
Portanto, Nestor Goulart, afirma que “a urbanização no Brasil assumiu configurações específicas que não podem ser explicadas com empregos de modelos constituídos para análise da urbanização européia”. Seu estudo é bastante importante para caracterizar a dominação do espaço público pelos colonizadores. Na intenção de organizar e preparar as cidades para o seu futuro desenvolvimento.

Resenha do Livro "Planeta Favela"

Mike Davis, 2006

O “Planeta Favela” mostra uma realidade: pela primeira vez na história a população da Terra terá uma população urbana superior que a rural, o que acatará mudanças superiores que o Neolítico e a Revolução industrial, segundo Mike Davis. Essa transformação não se deu de forma como previam os arquitetos e filósofos, mas geraram uma enorme favelização das cidades, principalmente do terceiro mundo. (Vide China, Brasil e Índia).

Os estudiosos diziam que o crescimento das cidades se daria como o crescimento de Manshester e Berlim, porém a realidade demonstrou que esse se deu como o crescimento da Dublin vitoriana. Ou seja, hoje os barracos das favelas pós-modernas podem ter inveja das casas do início do século.
Na analise das políticas de Estado para conter o avanço do crescimento populacional, a primeira tentativa foi remover os assentamentos humanos e favelas, como podemos exemplificar nos casos da Cidade do México, Rio de Janeiro, Vietnã do Norte, África, Índia e China. Logo depois, ao perceber que o problema era inevitável a política internacional muda...
O Conselho de Washington aprova políticas de urbanização de favelas a partir das organizações não governamentais e indica o para os Estado do terceiro mundo a sua minimização. Em outras palavras, “urbanizar as favelas não destruí-las”. “Governância participativa” e “sinergia” eram as palavras de ordem. A junção do anarquista Jonh Turner e do presidente do banco central, Macnamara, gerariam essas políticas de “auto-ajuda”, que eram muito insignificantes se pensássemos nas necessidades da população do mundo todo.
A fase neoliberal, a partir de 1970, foi quando as favelas mais cresceram no mundo. E a maioria das iniciativas Estatais de habitação popular foi assimilada pela classe média, inclusive no primeiro mundo como o caso de Nápoles, na Itália. Junto a isso se agravam as condições de vida nessas favelas. O caso desenfreado de AIDS na África é bastante exemplar.
O terceiro mundo vive essa crise da superpopulação urbana. 46 paises do mundo estão mais pobres hoje do que no início da década de 90. Os financiamentos para políticas de limpeza de Centros comprovam que quanto maior esses investimentos maiores são as desigualdades. A desigualdade urbana já é maior que desigualdade rural. São Paulo de 1980 tinha 40% de empregos vindos da indústria, em 2004 só 15%. De 96 à 2001, 36 milhões de operários foram demitidos. Na índia o PIB cresceu 6%, o resultado foi 1 milhão de novos milionários e 56 milhões de mineráveis. Para a índia a década de 90 foi a pior para o povo pobre e somando-se a isso os preços dos cereais subiram 58% de 91 a 94. No Brasil a força de trabalho informal já alcançou 37%.
“O século XX não se tornou uma época de revoluções urbanas, como imaginou o marxismo clássico, mas de levantes rurais e guerras camponesas de libertação nacional sem precedentes”. “Marx ficaria provavelmente chocado se descobrisse como, nos países em desenvolvimento, parte tão grande da massa transbordante não consiste em proletários legais oprimidos, mas de pequenos empresários extralegais oprimidos”.
Por fim, Mike Davis, afirma: “A doutrina do Pentágono está sendo reconfigurada nessa linha para sustentar uma guerra mundial de baixa intensidade e duração ilimitada contra segmentos criminalizados dos pobres. Esse é o verdadeiro “choque civilizatório”.” Quer dizer: A sociedade agrária tende ao fim, e a sociedade urbana vai tomar todo o território, o que gerará conflitos de ordem locais desenfreados. O autor foge de uma tentativa de minimizar ou contornar esses impactos. Essa deveria ser ação dos arquitetos e urbanistas, somado a negação da construção de espaços de segregação e espólio da classe, que vive do seu trabalho; a classe trabalhadora, que é mais ampla – e sempre foi – do que o proletariado.

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Resenha do livro "A cidade como um jogo de cartas"

Carlos Nelson, 1988.

O livro trata da história do planejamento urbano no Brasil, a partir da colonização, com intuito de gerar diretrizes para o planejamento das cidades de Roraima. “A cidade como um jogo de cartas” é uma metáfora sobre os jogos de poder que acontecem nas cidades com as regras das partidas e baralho.
No Brasil, os arquitetos e urbanistas vêm construindo padrões que seguem as seguintes orientações: Os valores são analisados em representações simbólicas e materiais e a partir dessas trocas e desses usos são feitas sínteses e análises. Essas, por sua vez, são, reciprocamente, geradoras de práticas positivas e teóricas, resultando por um lado “culturalismo”, onde os loteamentos são soluções, e por outro “racionalismo”, onde o conjunto habitacional é a resposta. Enquanto isso, a população analisa de outra forma: Os valores são chocados com os símbolos, representações e necessidades materiais. E a população faz a experiência entre os usos e as trocas na vida real.
As respostas a esse esquema só poderão ser sustentadas dentro de um propósito muito mais amplo de politização e democratização do conhecimento sobre espaço, que devem acontecer com aplicações, não sendo assim serão “puro diletantismo” teórico, afirma Carlos Nelson.
Portanto, “O especialista [do espaço urbano] deverá assumir um novo papel dentro dessa perspectiva. Ele é aquele que segue a partida com interesse, procura esclarecer dúvidas e pontos obscuros e funciona como mediador, aconselhando a atualização de estudos e modos de agir, à medida que verifique sua superação.” Então destrincha cada item do projeto urbano, da infra-estrutura as escalas de projeto. A rua, o lote, o bairro, enfim, a cidade.
Conclui afirmando que “há 50 anos somos modernos. O resto do mundo até já se converteu em um duvidoso pós-modernismo. Aqui, no entorno nem isso surgiu de forma convincente. Vivemos num estranho moderno de antigamente.” Ou seja, sua tentativa é afirmar os equívocos e esquemas dos projetos idealistas. Revelando a necessidade dos projetos serem vinculados à materialidade. Em outras palavras, propõe um “novo” racionalismo, que dê a devida atenção às escalas do projeto e a importância necessária ao profissional de arquitetura e urbanismo. Seu intuito é desmistificar que as escolas de planejamento tenham relações incomunicáveis, propondo um projeto vivo e ligado ao seu tempo.

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Resenha do livro "Arquitetura da cidade"

Aldo Rossi - 1966
“Arquitetura da cidade” é uma tentativa de estudar a cidade pelo caminho da arquitetura. Ou seja, Aldo Rossi constrói conceitos para compreender a cidade. O conceito básico é o fato urbano e a teoria da cidade. Argumenta que a cidade tem que ser encarada como um artefato, que o entorno da cidade cria sua forma e analisa as funções da cidade a partir do locus. Define a morfologia urbana como a descrição dos fatos urbanos e a “alma da cidade” como a qualidade do fato urbano. O estudo aprofunda as questões das tipologias, da s partes, do locus e da política como escolha da cidade.

Aldo Rossi descreve os fatos urbanos como condicionados a cidade. Reafirma a cidade como uma coisa humana por excelência. Estuda esse fenômeno e destrincha o sistema espacial das cidades, chegando à questão da tipologia dos edifícios. Trabalha o conceito de tipo e modelo, onde o “modelo é preciso e o tipo é mais ou menos vago” levando a conclusão sobre a permanência de tipologias, o que não quer dizer que a forma de se viver permaneça a mesma.

A critica ao funcionalismo e a arquitetura orgânica como correntes principais do modernismo mostra a raiz comum e a causa da sua fraqueza. Rossi mostra que para eles “os fatos urbanos são um mero problema de organização não apresentam continuidade, nem individualidade, monumentos e a arquitetura não tem razão de ser” e considera esses argumentos puramente ideológicos.

Sua pesquisa sob influencia iluminista nos leva aos Tratadistas. O que quer dizer, que Rossi resgata valores como os da rua, do bairro e do quarteirão, desenvolvidos nos tratados. Discussões que o fazem afirmar a forma, não como uma redução ao momento lógico, mas como afirmava os tratadistas “a bela cidade como boa arquitetura” e também que os fatos urbanos são complexos, pois “é na totalidade que se constrói para si mesmo” e não na parte. As funções são parte da análise da morfologia urbana, mas “o que permanece no fato urbano no momento em que a função perde seu valor é que de fato, muitas vezes, constitui o fato urbano”. “As permanências podem ser consideradas elementos propulsores que ligam à totalidade, ou não fazem ligação nenhuma ao fato do sistema urbano”. Por fim existe uma ligação que será realizada pela história e pela arte, ou seja, pelo ser e pela memória.

As áreas de estudo para o autor são recortes da cidade, remete ao conceito de bairro, que expõem esses elementos vistos acima, logo a área de estudo passa a ser entendida como um elemento qualitativo e sua “unidade é dada fundamentalmente pela história, pela memória que acidade tem de si mesma”. A partir daí crítica o zoneamento tendo como caso Chicago e o plano de Parck e Burges.

Após estudar esses elementos, Rossi, define os elementos primários da cidade. Sendo eles: a residência (mostrando que nenhuma cidade pode ignorar a residência como componente de sua forma. A residência não é amorfa), as atividades fixas e o trafego, batizando-os de catalisadoras, que originalmente são expressões de funções, porém o desenvolvimento do processo urbano isso se transforma. E sua permanência é memória constituindo um fato urbano. Por exemplo, “os monumento são uma permanência porque já se acham em posição dialética no interior do desenvolvimento urbano”. Essas transformações são importantes, pois elas possibilitam as diferenças das partes ligadas à totalidade, o que possibilita a liberdade de escolha. Como podemos ver em Londres, Viena, Roma e etc., cidades com diversos fatos urbanos. A geografia da cidade também é um elemento inseparável da sua história, mesmo em cidades planejadas ou não, pois o plano pode ser considerado um elemento primário, como Leningrado e Brasília.

Os fatos urbanos são individuais e é no conceito de locus, onde Rossi encontra sustentação para essa afirmação. Citando Vaiollet-Le-Duc, quando reconhece que a arquitetura não pode ser transportada. A partir disso a questão do arbitrário e da tradição aparece, sua solução é encontrada somente no locus, que se somando ao rigor da técnica (a exemplo de Vaiollet-Le-Duc e Vitor Hugo) encontraremos que “a história da cidade é também a história da arquitetura”. “As cidades são o texto da história” onde os lugares brigam com o ambiente, que por sua vez brigam com os monumentos e daí constitui a individualidade. Admiti que a arquitetura é um componente do fato urbano, logo possui um valor transcendente, e crítica os socialistas que reduzem a cidade as funções (residência e serviços).

Na evolução dos fatos urbanos, a economia, a forma que as forças agem e as diferentes mudanças (como os planos) são os principais elementos para entender a cidade. A partir dessas questões o autor estuda o caso da expropriação e da propriedade privada. O que alguns teóricos afirmam ser a questões que diferencia a cidade capitalista e socialista. Como exemplo é utilizado o caso do Plano Cerdá para Barcelona (malha e quadra que orienta a cidade) e o plano Haussaman para Paris (expropriação e sobreposição de planos). Suas diferenças provam que a dimensão não é um elemento da questão do fato urbano. Outro exemplo é a própria revolução francesa que loteou os lotem sem critério sem preocupação com o espaço público. E também a Alemanha, onde foi permitido que dívidas do Estado fossem pagas com áreas públicas, prejudicando a cidade. Tipologicamente, nós podemos afirmar, que tanto os casarios podem dar soluções às cidades, tanto no caso de Viena e sua anta densidade, quanto no caso das casas populares de Berlim.

Rossi, para negar que os problemas da cidade sejam advindos da industrialização, cita Engels que “nega que, de algum modo, esse fenômeno diga respeito ao urbanismo, ao contrário, ele declara que pensa que iniciativas espaciais são capazes de intervir nesse processo isso é pura abstração, é praticamente uma operação reacionária”. E termina crendo que tudo que se some a essas posições para ele são consideradas equivocadas.

Por fim, conclui estabelecendo que a cidade tenha a forma de sua política e os signos de sua vontade. Numa relação biunívoca entre o elemento arbitrário e o elemento tradicional na arquitetura urbana. E afirmando que nenhum crescimento é espontâneo. Fecha o livro com uma imagem da Moscou Stalinista, expondo casarios no primeiro plano e edificações palacianas neoclássicas ao fundo.

quarta-feira, 22 de agosto de 2007